Vivemos cansados: o esgotamento na era do desempenho
Vivemos em uma época marcada pelo cansaço. Mas não é mais o cansaço físico, resultado de longas horas de trabalho manual ou esforço visível. O cansaço de hoje é mais sutil, silencioso e, muitas vezes, sem nome. É um esgotamento que vem de dentro, como se estivéssemos sempre devendo algo — a nós mesmos.
Na chamada "sociedade do desempenho", já não somos mais cobrados apenas por chefes, pais ou instituições. A cobrança agora vem de dentro. Somos, ao mesmo tempo, patrão e empregado, treinador e atleta, exigindo de nós produtividade, foco, criatividade, alta performance. Tudo o tempo todo. A liberdade de poder fazer tudo se transforma numa prisão onde não conseguimos parar. Onde dizer “não” parece um fracasso.
Não é coincidência que doenças como depressão, burnout e ansiedade tenham se tornado tão comuns. Elas são o resultado direto dessa lógica que nos transforma em projetos ambulantes, constantemente em desenvolvimento, mas quase nunca em descanso. Queremos dar conta de tudo, performar bem em todas as áreas da vida, e nos sentimos culpados quando não conseguimos.
O filósofo Byung-Chul Han nomeia esse fenômeno como uma violência psíquica — não a que vem de fora, mas aquela que nós mesmos internalizamos. Uma violência que se disfarça de liberdade, de escolha, de empoderamento, mas que nos adoece justamente porque nos faz acreditar que podemos e devemos dar conta de tudo sozinhos.
Talvez seja hora de questionar esse modelo. De reaprender a parar. De valorizar o silêncio, o ócio criativo, o não saber. De recuperar o direito ao limite. Porque, ao contrário do que nos dizem, não somos máquinas de desempenho. Somos humanos. E estar cansado o tempo todo não é um sinal de força — é um sinal de alerta.
Sobre o livro "A Sociedade do Cansaço" do Autor: Byung-Chul Han lançado no Ano: 2010, seguem alguns itens:
🌐 Ideia central:
Byung-Chul Han, filósofo sul-coreano radicado na Alemanha, analisa como as formas de sofrimento psíquico contemporâneas — como depressão, ansiedade, burnout — são sintomas de uma sociedade hiperprodutiva, centrada no desempenho e na autoexploração.
🧠 Principais argumentos:
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Do "dever" ao "poder":
Vivemos a transição de uma sociedade da disciplina (repressiva, com proibições) para uma sociedade do desempenho, onde o sujeito acredita que é livre porque "pode tudo", mas na verdade se explora a si mesmo como um projeto sem fim. -
A positividade tóxica:
A pressão para ser sempre produtivo, feliz, criativo e motivado leva a um excesso de positividade, que paradoxalmente adoece. Já não há espaço para o tédio, a contemplação ou o descanso. -
Doença do século:
As doenças típicas de hoje não são mais infecções ou vírus (como na sociedade imunológica), mas transtornos psíquicos: depressão, TDAH, burnout. São expressões de um sujeito esgotado, que perdeu a capacidade de parar, contemplar e dizer "não". -
A lógica neoliberal internalizada:
O indivíduo contemporâneo se tornou um "empreendedor de si", que se cobra, se vigia e se autocondiciona a performar. Essa autoexploração é mais eficiente que a dominação externa, porque o sujeito pensa que está sendo livre, quando está se oprimindo.
🧩 Conceitos-chave:
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Sociedade do Desempenho: substitui a repressão por excesso de estímulo e cobrança interna.
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Sujeito de Desempenho: pensa que é livre, mas vive se cobrando sem limites.
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Cansaço Existencial: o esgotamento vem da perda do sentido, da saturação de possibilidades e da incapacidade de contemplação.
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Violência neuronal: expressão usada para descrever esse tipo de sofrimento psíquico invisível, autoinfligido e silencioso.
🔍 Conclusão:
Han propõe que é preciso reaprender a contemplação, o silêncio, a pausa. A crítica não é contra o progresso, mas contra o excesso de estímulos e a ideia de que o valor de uma vida se mede apenas pelo desempenho.
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