Ser generoso é uma virtude, sem dúvida. Doar-se ao outro, oferecer tempo, recursos ou apoio, é um gesto que pode transformar vidas. Mas o que acontece quando a generosidade extrapola os limites saudáveis? Quando, em vez de ser uma escolha, ela se torna quase uma compulsão? É aí que a doação excessiva deixa de ser um ato altruísta para se transformar em uma armadilha – para quem doa e, muitas vezes, para quem recebe.
Há quem se dedique tanto aos outros que se esquece de si mesmo. Essas pessoas se tornam um poço sem fundo de doações: estão sempre disponíveis, prontas a dizer "sim", mesmo quando estão exaustas, sobrecarregadas ou precisando de ajuda elas mesmas. Essa postura, muitas vezes, não vem apenas de um desejo de ajudar, mas de uma necessidade inconsciente de ser valorizado, amado ou aceito através do que se pode oferecer.
O problema é que, nesse excesso, o outro – aquele que recebe – pode começar a enxergar quem doa apenas como um recurso, algo utilitário. Não raro, a relação se desequilibra: enquanto um dá tudo de si, o outro aprende a esperar, a pedir, e, muitas vezes, a exigir. A pessoa generosa passa a ser vista não como alguém completo e digno de cuidado, mas como um meio para atender necessidades, como uma espécie de “solucionador automático de problemas”.
E o impacto não para por aí. Quem dá em excesso começa a sentir um vazio, uma sensação de esgotamento emocional e físico. A falta de reciprocidade pesa. Mas, ao mesmo tempo, muitas vezes surge a dificuldade de parar, como se a identidade da pessoa estivesse completamente atrelada ao papel de ser o doador, o “resolve-tudo”. É como se, ao deixar de doar, perdesse o seu valor.
A generosidade desmedida também pode ser prejudicial para quem recebe. Tornar-se dependente da doação do outro é um risco, pois inibe a capacidade de desenvolver autonomia e responsabilidade. Quando alguém se acostuma a sempre contar com a ajuda alheia, pode deixar de buscar soluções próprias, de crescer e amadurecer. Nesse ciclo, ambos saem prejudicados: o doador se esgota e o receptor se estagna.
Doar é importante, mas o equilíbrio é essencial. A generosidade deve ser um fluxo que nutre, não uma via de mão única que suga. É preciso saber dizer “não” quando necessário, estabelecer limites, cuidar de si mesmo antes de cuidar do outro. Afinal, doar o que você não tem – seja energia, tempo ou recursos – é uma forma silenciosa de autossabotagem.
Ser generoso é belo, mas ser sábio é ainda mais importante. A boa doação acontece quando é feita com consciência, sem se anular, sem se perder no processo. Você não precisa ser um poço sem fim. Você merece, acima de tudo, cuidar de si mesmo.
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