Existe uma diferença crucial entre a psicanálise freudiana e lacaniana no que diz respeito à dinâmica do desejo e seu objeto.
Essa diferença entre o objeto perdido de Freud e o objeto nunca encontrado de Lacan é um marco importante no desenvolvimento da teoria psicanalítica e na forma como entendemos o desejo e a subjetividade.
Para Freud, o objeto perdido é a origem do sofrimento psíquico. Ele entende o desejo como algo orientado pela busca de um objeto específico que, em algum momento, foi possuído e perdido – um objeto idealizado, muitas vezes ligado a experiências primordiais de satisfação (como a relação do bebê com a mãe). Assim, o desejo freudiano tende a estar no final da trilha, no horizonte inalcançável de uma repetição impossível desse encontro inicial.
Já para Lacan, o objeto "a" não é o objeto do desejo em si, mas sua causa. Ele não é algo concreto ou recuperável, mas um vazio, uma falta estruturante que impulsiona o sujeito a desejar. Essa falta é o motor do desejo e está no início do percurso, desencadeando toda a busca. Em vez de ser algo que se perdeu, o objeto "a" lacaniano é o que dá consistência ao próprio desejo: uma presença-ausência que mantém o sujeito em movimento.
Enquanto Freud parece apontar para o fim da trilha, como se houvesse uma meta (ainda que inatingível), Lacan coloca o desejo em um ciclo infinito, alimentado pela falta estrutural que nunca se preenche. O objeto não está "lá fora", mas opera como uma engrenagem que estrutura o sujeito desde o início.
Essas distinções refletem uma mudança na forma de entender o desejo: de algo que busca reparar uma perda para algo que é movido pela falta como condição existencial.
Para Freud, o objeto perdido está relacionado a algo que, em algum momento, existiu e foi perdido, como a ligação simbólica e afetiva com a mãe ou a satisfação primordial (o prazer inicial no aleitamento, por exemplo). É algo que o sujeito tenta reencontrar ao longo da vida, mas que, por ser passado e idealizado, nunca pode ser totalmente recuperado.
Para Lacan, no entanto, o objeto "a" não é algo que foi perdido, mas sim algo que nunca foi encontrado em primeiro lugar. Ele é estruturado como uma falta primordial, um vazio constitutivo do sujeito e do desejo. O sujeito não busca recuperar algo que teve, mas sim preencher um espaço de ausência, um vazio que nunca teve preenchimento – e nunca terá.
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